Vamos começar pelo óbvio. Um dos (vários) pontos que ficaram explícitos (ao menos para mim), no Brasil, durante a pandemia do COVID-19 (que estamos vivendo e sem um horizonte para o seu término!) foi a absoluta falta de informação da população (e mesmo de profissionais de educação) sobre EAD.
Pode parecer arrogância ou pedantismo da minha parte (o que não é!) é só uma constatação: Muitas pessoas usam os termos: "aulas online", "vídeo aulas", "ensino virtual", ensino a distância, etc... como se fossem sinônimos de Educação a Distância.
E mesmo entre os profissionais de educação, muita gente considera que "ensino" é sinônimo de "educação". E não se trata aqui de um formalismo besta ou mero preciosismo de quem vos escreve! São coisas distintas! E a falta de compreensão destas diferenças pode explicar um pouco (entre vários outros elementos, obviamente) o fracasso de nossos (atuais - pré-pandemia) sistemas escolares! Muitos deles somente se preocupam com "ensino" e pouco se importam se aprendizagens estão ocorrendo ou quais são os objetivos de suas "estratégias" de ensino...
Não sou especialista em Educação a Distância! Mas sei pesquisar :-) E isso já é 50% do caminho, em minha humilde opinião!
Então, qualquer pessoa que se interesse em pensar sobre EAD no Brasil precisa, minimamente, começar pela leitura da legislação sobre o tema! A ABED, reuniu num PDF de 476 páginas as legislações nacionais, estaduais e municipais sobre EAD no Brasil.
Lá, na página 191 você encontra:
"A.EDUCAÇÃO BÁSICA na modalidade de Educação a Distância: De acordo com o Art. 30º do Decreto n.º 5.622/05, "As instituições credenciadas para a oferta de educação a distância poderão solicitar autorização, junto aos órgãos normativos dos respectivos sistemas de ensino, para oferecer os ensinos fundamental e médio a distância, conforme § 4o do art. 32 da Lei no 9.394, de 1996, exclusivamente para:
I - a complementação de aprendizagem; ou
II - em situações emergenciais."
Antes que você, querida leitora/or, levante as pedras tenha em mente que o fato de ser legalmente permitido não significa que tenhamos as condições de fazê-lo.
Outro ponto que gostaria de destacar (página 205):
"Art. 80. O Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada.
§ 1º. A educação a distância, organizada com abertura e regime especiais, será oferecida por instituições especificamente credenciadas pela União.
§ 2º. A União regulamentará os requisitos para a realização de exames e registro de diploma relativos a cursos de educação a distância.
§ 3º. As normas para produção, controle e avaliação de programas de educação a distância e a autorização para sua implementação, caberão aos respectivos sistemas de ensino, podendo haver cooperação e integração entre os diferentes sistemas.
§ 4º. A educação a distância gozará de tratamento diferenciado, que incluirá:
I - custos de transmissão reduzidos em canais comerciais de radio difusão sonora e de sons e imagens;
II - concessão de canais com finalidades exclusivamente educativas;
III - reserva de tempo mínimo, sem ônus para o Poder Público, pelos concessionários de canais comerciais."
Os grifos são meus! Muita gente acha que só é possível fazer "educação a distância" via "internet" Se existe um dispositivo que alcança próximo de 100% dos casos no Brasil é a televisão. E, em 2017, a cobertura da TV digital no Brasil era de 80%. Logo o uso de estratégias de educação a distância (de massa) usando a internet não só é o menos adequado como pode ser feito de outras maneiras! Somente os "deslumbrados" pensam (primariamente) nesta opção! A maior parte da entrega de conteúdos (que é apenas uma parte da educação) deveria ser feita por TV ou rádio, em minha humilde opinião (pense em educação de massa)!
Obviamente que isto implica em planejamento e preparação! Não estou propondo que se transfira as aulas expositivas para a TV! Isto é coisa de leigos ou picaretas. Cada material deve ser preparado para mídia em que ele será entregue e pensado em como será a interação de quem aprende com este material (é isso que diferencia educação de ensino!).
E por último mas não menos importante, vale a pena se destacar que, no Brasil estritamente falando, EAD, por força da lei é sempre SEMI-PRESENCIAL:
DECRETO N.º 2.494, DE 10 DE FEVEREIRO DE 1998.Regulamenta o Art. 80 da LDB (Lei n.º 9.394/96)
"Art. 7º A avaliação do rendimento do aluno para fins de promoção, certificação ou diplomação, realizar-se-á no processo por meio de exames presenciais, de responsabilidade da Instituição por último mas não menos importante credenciada para ministrar o curso, segundo procedimentos e critérios definidos no projeto autorizado."
Como se pode notar, a simples leitura da legislação sobre EAD, já nos ajuda a filtrar simplismos, ufanismos e condenações da EAD a priori...
(LOBO NETO, Francisco - Sobre Educação a Distância: regulamentação. Brasília: Plano Editora 2000, pp 10.)
Numa eventual 2º parte desta série de "tempestades de ideias", pretendo levantar algumas possibilidades de como se aplicar EAD (Educação a Distância), no nosso atual contexto de crise, nos segmentos onde ele possa ser aplicado!
Mas se você tem pressa, o "sul" de como isso pode ser feito foi, brilhantemente, apontado pelo Marco Bento no seu fantástico: Ser Professor e ser "covidado" a reinventar-se.
Eu queria deixar claro que, diante da crise sanitária que vivemos eu sou contra dois extremos:
- Não temos as condições sociais, tecnológicas e formação profissional ideais, logo não devemos fazer nada vamos apenas aguardar em nossas casas! Crianças só fiquem em casa!
- Vamos reproduzir nossa escola presencial e obsoleta no formato de vídeo aulas... e tchan tchan... está tudo resolvido!
Há, entre esse dois extremos algumas possibilidades! E estas possibilidades devem ser construídas com diálogo entre todos os envolvidos, com esforço de todos os envolvidos... e, por mais óbvio que seja, vale a pena explicitar: Não existe uma solução única para todos os contextos...